Merkel: críticas concretas em vez de condenações genéricas aos EUA
12 de janeiro de 2006Caso o presidente George W. Bush tenha realmente acreditado que com Angela Merkel seria mais fácil do que com Gerhard Schröder, ele comemorou cedo demais. Merkel não será uma parceira dócil, isso ela já deixou muito claro com o pedido de que o campo de prisioneiros de Guantánamo seja fechado. Mas será uma parceira confiável, isso também já se tornou claro. Merkel pensa de maneira estratégica, não tática, e é dessa forma que ela faz uso de suas declarações.
Já durante a visita da secretária norte-americana de Estado, Condoleezza Rice, em dezembro, Merkel não deixou dúvidas de que, para ela, também na luta contra o terror os princípios do Estado de Direito têm prioridade. Esta chanceler federal não altera as diretrizes de sua política externa em praça pública e não faz críticas a aliados em palanques eleitorais, mas as faz onde a princípio deveriam ser feitas: numa conversa olho no olho. De fato, nas palavras de Merkel sobre Guantánamo há apenas uma coisa de notável: a reação de surpresa da opinião pública alemã. George W. Bush certamente já estava há quatro semanas preparado para elas.
O que Merkel disse abertamente não é nada mais do que obviedade e consenso na Europa. Mas também é verdade que ela é a primeira entre os chefes de Estado europeus a fazer pedidos tão claros em temas específicos, como o tratamento de prisioneiros em Guantánamo, o seqüestro de suspeitos de terrorismo ou a instalação de prisões secretas da CIA. Críticas concretas em vez de condenações genéricas – mesmo um George W. Bush pode lidar com isso, até porque Merkel sempre conecta suas observações com um reconhecimento da parceria teuto-americana.
Se o governo anterior usou suas críticas ao comportamento norte-americano antes da guerra do Iraque como pretexto para esfriar, de uma maneira geral, as relações políticas entre os dois países, Angela Merkel age de forma pragmática. Para ela, críticas em pontos específicos e apoio político básico não são excludentes – ao contrário, é apenas com o trabalho de parceria que conflitos podem ser resolvidos. Merkel não está sob a suspeita generalizada de antiamericanismo e aproveita a liberdade de movimento que essa situação lhe proporciona.
Com as críticas às vésperas de sua viagem aos Estados Unidos, ela mais uma vez ampliou seu campo de ação. Merkel seguiu para Washington com forte vento a favor e sem riscos de adernar. Ninguém espera que o governo norte-americano cumpra uma única exigência sua – muito menos a própria Merkel. Os aplausos já estão garantidos só por ela tocar nos pontos críticos.
Por sua vez, George W. Bush encarará de frente uma chanceler federal que, apesar de todas as críticas, irá mesmo é se apresentar como parceira. Mas ela o fará de uma posição fortalecida – firmemente ancorada na Europa, com ampla maioria no governo e grande apoio popular às costas.
Esta Angela Merkel tem muito mais chances de ser levada a sério em Washington do que seu antecessor. E isso é urgente, pois já faz tempo que a Alemanha não está mais no alto da lista de prioridades norte-americanas e, com Schröder, corria o risco de perder ainda mais terreno.
Trata-se da guerra conjunta de Estados de Direito contra o terror, da parceria com a (na melhor das hipóteses) semidemocrática Rússia ou dos problemas nucleares com o Irã – em todos esses temas, a perspectiva de sucesso para a Alemanha e a Europa é muito maior com os Estados Unidos do que sem ou mesmo contra eles.
Washington, porém, espera de seus parceiros um apoio, se não militar, pelo menos político ou econômico no Iraque. Consciente desses fatos, Merkel tratou de cravar com antecedência os seus limites, de forma que o preço por uma melhora nas relações teuto-americanas não seja muito alto.