'Guerra' no Afeganistão
5 de abril de 2010Após a morte de três soldados alemães nas imediações de Kunduz, o ministro alemão da Defesa, Karl-Theodor zu Guttenberg, da União Social Cristã (CSU, em alemão), denominou de "guerra", pela primeira vez, os combates no Afeganistão. Mesmo assim, ele ainda defende a participação alemã na operação militar internacional, desde que a Alemanha siga a nova estratégia planejada.
Na sexta-feira (02/04), um confronto de várias horas entre o Exército alemão e combatentes talibãs custou a vida de três soldados alemães e seis afegãos. O cotidiano no Afeganistão é marcado por explosões praticamente diárias de bombas, carros em chamas, tiroteios e mortes. Até agora, o governo alemã havia evitado denominar a operação militar de "guerra".
"A perfídia e ao mesmo tempo a complexidade do ataque" revelam a realidade no Afeganistão, declarou Guttenberg. Diante dessa realidade, "daria muito bem para se falar de guerra no sentido corriqueiro do termo", consentiu o ministro que, ainda em novembro passado, rejeitara nomear dessa forma a atividade dos soldados alemães no Afeganistão.
Na sexta-feira passada, o mais grave confronto vivenciado pelo Exército alemão no Afeganistão desde o início da operação internacional, há oito anos, também implicou um grave incidente: soldados alemães mataram oito soldados afegãos por engano. Segundo Guttenberg, o governo alemão já apresentou oficialmente suas desculpas ao governo afegão. O caso está sendo investigado por autoridades alemãs e também pela Otan
Estratégia dos nomes como legitimação militar
Em fevereiro passado, o governo alemão reavaliou a operação militar no Afeganistão e a classificou como "conflito armado". Anteriormente, Berlim ainda se referia a uma "operação de estabilização".
A cautela dos políticos na nomeação de conflitos militares se deve ao fato de haver uma definição bastante precisa de "guerra" no direito internacional. Para um confronto ser denominado assim, ele precisa ser travado entre Estados e ter sido provocado por uma "declaração de guerra".
Como já não se fazem mais declarações de guerra no sentido estrito desde 1945, o direito internacional criou o conceito de "conflito armado", a ser diferenciado em "internacional" ou "não internacional". Um conflito armado não internacional seria o que se chama de guerra civil em linguagem corrente.
Quando as Nações Unidas constatam um "conflito armado", isso implica uma ampliação das possibilidades de atuação dos soldados in loco. Essa denominação permite recorrer a armas em reação a agressores. Em determinadas circunstâncias, mortes entre a população civil também podem ser consideradas uma consequência aceitável dos conflitos armados.
O bombardeio de um caminhão-tanque dominado por talibãs, ocorrido em setembro passado sob comando alemão e causador de inúmeras mortes entre a população civil, seria desproporcional como operação policial, mas – no contexto de um conflito armado – deve ser avaliado conforme o direito internacional. Na época desse bombardeio nas imediações de Kunduz, as Nações Unidas já haviam classificado a situação no Afeganistão como um conflito armado.
Ameaça de impopularidade ainda maior
Após os acontecimentos de sexta-feira, que ameaçam tornar ainda mais impopular entre a população alemã a presença militar do país no Afeganistão, Guttenberg negou que a nova estratégia do governo tenha fracassado. Ele explicou que a tática só surtirá efeito quando houver contingente suficiente e o processo de formação militar estiver avançado.
A nova estratégia prevê o aumento do contingente alemão de 4.500 para 5.350 soldados, além de um treinamento mais intenso das forças de segurança afegãs. Segundo os cálculos do governo em Berlim, esse plano deverá ter sido implementado até o final do segundo ou do terceiro trimestre deste ano.
Nos últimos dias, o Afeganistão foi a tônica das manifestações pacifistas tradicionalmente realizadas na Alemanha durante a Páscoa. Ativistas em inúmeras cidades alemãs reivindicaram o fim da presença militar alemã no país asiático. Para os pacifistas, a morte dos três soldados na sexta-feira representa uma nova advertência para se retirar de uma vez por todas dessa guerra.
No domingo, um avião com os corpos dos três soldados alemães de 25 a 35 anos de idade mortos durante combates com talibãs aterrissou na área militar do aeroporto de Colônia/Bonn. O ministro da Defesa, Guttenberg, era um dos políticos à espera da aeronave no domingo de Páscoa.
SL/afp/apn
Revisão: Roselaine Wandscheer