O alto preço da resistência à extrema direita
6 de setembro de 2020
Dorothea Schneider mora em uma área que é um sonho em termos de paisagem: colinas verdes onduladas e campos de colza amarelos no verão. E bem no leste de Görlitz: a pérola arquitetônica bem na fronteira com a Polônia. Turistas de todo o mundo se deliciam com o centro antigo da cidade, com suas magníficas casas no estilo do gótico tardio, renascentista e barroco. Mas neste ambiente também há muitas manchas marrons. A cena neonazista, em todos os seus tons, é algo que não passa despercebido na região.
Nesse meio, Schneider é tida como uma inimiga, alguém a se odiar. Mãe de quatro filhos, ela atua contra nazistas, contra os chamados Reichsbürger (cidadãos do Reich), que negam a legitimidade do Estado alemão pós-guerra e quer o retorno das fronteiras nacionais de 1937, e afins. Ela é presidente da associação Paradiesvögel statt Reichsadler (Aves do paraíso em vez de águias imperiais, em tradução liberal).
Schneider luta contra o crescente avanço da direita. Por exemplo, organizando um desfile de carros com adornos coloridos na estrada B96, onde há semanas ocorrem protestos todos os domingos contra as restrições para controle da epidemia de coronavírus. Os radicais agitam bandeiras alemãs, mas também bandeiras do Império Alemão.
São pessoas como Schneider que o governo alemão agora quer dar mais apoio, após o ataque racista em Hanau, que deixou nove mortos em fevereiro de 2020. Para isso, foi criado o comitê ministerial contra extremismo de direita. O grupo de alto escalão, liderado pela chanceler federal alemã, Angela Merkel, se reuniu pela segunda vez nesta quarta-feira (02/09) e ouviu o que os afetados vivenciam em termos de ódio, hostilidade e até tentativas de assassinatos.
Participaram do encontro em Berlim representantes de organizações que lutam pelos direitos de migrantes e refugiados, como a Fundação Amadeu Antonio, e também especialistas da área. Na mesma ocasião, a rede para a prevenção do extremismo de direita explicou suas recomendações ao governo. Schneider era uma das presentes. Ela sabe o que é ser ameaçada e difamada por extremistas de direita. E conta que durante seu desfile contra os negacionistas, ela foi "saudada" com a saudação nazista e foi alvo de ovos jogados pelos extremistas. Já a casa de uma ativista de seu movimento foi pichada com suásticas.
"Proteção contra ataques de extremistas de direita foi uma das recomendações mais importantes", diz Jutta Weduwen, diretora executiva da Ação Serviço de Reconciliação pela Paz, que uniu forças com outras organizações na rede para a prevenção do extremismo de direita. "A sociedade civil é o pilar central na luta contra o extremismo de direita", afirma.
Pessoas corajosas como Schneider esperam receber mais apoio. Ela afirma que em áreas rurais a aceitação de extremistas de direita sempre foi maior: "E eles continuam crescendo", sublinha, acrescentando que essa é uma preocupação adicional para os residentes. "Você não tem lá a mesma proteção que tem na cidade grande", frisa.
Markus Nierth sabe por experiência própria como as redes sociais são importantes na luta contra o extremismo de direita, o racismo e o antissemitismo. O ex-prefeito da pequena cidade de Tröglitz, no estado de Saxônia-Anhalt, renunciou ao cargo em 2015 após ele e sua família terem sido permanentemente e severamente ameaçados por fazerem campanha para o acolhimento de refugiados.
Na quarta-feira, ele pegou o trem de Tröglitz para Berlim para apoiar a rede de prevenção de extremismo de direita. Ele disse que veio à capital alemã representando muitos políticos locais e estaduais. Porque mesmo sem estar mais no cargo, ele continua atuando contra a propaganda e a violência de extrema direita. Ele diz que por isso tem pago um preço alto há anos. Markus Nierth chama isso de "bullying social". Alguns que o apoiavam no passado começaram a se afastar dele.
"A estratégia de conquista de espaço da extrema direita funcionou", lamenta Nierth se referindo à região em que continua a viver, apesar da hostilidade que enfrenta. Ele diz que após ele ter deixado o cargo de prefeito, outros extremistas de direita se estabeleceram na área.
O neonazista condenado a 10 anos de prisão por cumplicidade com o grupo terrorista Clandestinidade Nacional-Socialista (NSU) Ralf Wohlleben mora nas proximidades de Tröglitz. Depois de mais de seis anos sob custódia, ele teria que passar no máximo três anos e quatro meses na prisão. O fato de Wohlleben ter apelado faz com que o julgamento ainda tenha que ser analisado por uma instância superior. É por isso que ele está novamente solto, pois o tribunal e o Ministério Público não veem risco de fuga.
O fato de alguém como Wohlleben morar perto de Tröglitz também diz muito sobre a crescente influência da extrema direita na região, segundo o ex-prefeito. Nierth diz ser necessário criar uma rede "para combater a soberania dos extremistas" na área.
Ele sabe melhor do que ninguém como isso pode ser difícil ou mesmo impossível. Mas desistir ainda está fora de questão para ele. Isso também se aplica a Schneider. "Pode ser muito desanimador ver que as estruturas de extrema direita estão ficando cada vez maiores".
E, no entanto, ela continua como uma das "aves do paraíso", como sua iniciativa se chama, de forma jocosa. Águias imperiais, o símbolo da direita, já existem em quantidade suficiente voando na região. "Devemos nos insurgir quando as coisas ficam desconfortáveis", diz Schneider: "Eu também quero ser um modelo para meus filhos."