A expectativa antes da aparição de Carles Puigdemont no Parlamento da Catalunha era grande. As pressões sofridas pelo chefe de governo da região nos últimos dias também. O atraso no início da sessão parlamentar foi causado por conversações de última hora entre Puigdemont e os parceiros de esquerda da coalizão do Govern de Catalunya, cujas bases mais radicais consideraram o discurso do líder uma "traição inadmissível".
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O discurso de Puigdemont se manteve fiel à sua linha argumentativa dos últimos meses. Com seu tom desafiador, ele chegou a ir além, ao dizer que a recente fuga de empresas da Catalunha não tem "efeito real" sobre a força econômica da região.
Puigdemont recordou em seu discurso as "humilhações" sofridas pela região durante os últimos 15 anos por causa do Estado espanhol: a modificação, pelo Tribunal Constitucional, de aspectos sensíveis de seu estatuto de autonomia de 2006, a reiterada recusa do governo central de levar a cabo uma consulta popular de comum acordo sobre a independência da Catalunha, as sanções sofridas por aqueles que quiseram impor uma consulta sobre o assunto em 9 de novembro de 2014 e, finalmente, a violência empregada pelas forças de segurança espanholas durante o referendo do último dia 1º de outubro.
Apesar de ter sido realizada em condições irregulares, Puigdemont deu legitimidade ao resultado dessa votação e declarou a independência da Catalunha como República independente. Em seguida, suspendeu a declaração e apelou ao diálogo.
A freada brusca de Puigdemont decepcionou muitas pessoas na Catalunha. Mas, dadas as circunstâncias, era o mais sensato a fazer. Se tivesse mantido um curso confrontador, seguindo adiante com a independência, teria dado um salto para um abismo de consequências imprevisíveis para a região.
Puigdemont abriu uma oportunidade de diálogo que Mariano Rajoy não deve desperdiçar. Entrincheirado na frente legal, o presidente do governo espanhol nãonão cedeu nenhum milímetro em direção a negociações. Mas, após as imagens do dia 1º de outubro, os olhos da Europa e do mundo observam o conflito com preocupação.
Rajoy deve sair para o terreno político e iniciar negociações com a Catalunha. Os espanhóis precisam de um presidente do governo que faça algo mais do que utilizar a Constituição como escudo. No momento mais crítico da Espanha após várias décadas de democracia, Rajoy deve demonstrar um espírito mais aberto ao diálogo e provar que seu governo é capaz de fazer a política digna de um país da relevância da Espanha na União Europeia.