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Quais as perspectivas para as negociações Rússia-Ucrânia?

Roman Goncharenko
21 de março de 2022

Enquanto bombardeios russos contra a Ucrânia continuam, Kiev e Moscou negociam. Será possível chegar a um acordo? Quando e em que condições? Ou as negociações são apenas uma cortina de fumaça? A DW ouviu especialistas.

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Tanques russos destruídos na região de Sumy, na UcrâniaFoto: IRINA RYBAKOVA/UKRAINIAN GROUND FORCES/REUTERS

A guerra da Rússia contra a Ucrânia está em sua quarta semana. Em meio às notícias sobre combates e vítimas, também há relatos sobre negociações entre Moscou e Kiev. Após algumas reuniões em Belarus, as negociações ocorrem agora por videoconferência. Até agora, sem resultados concretos.

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, disse que Moscou não desistirá de seu "plano" até Kiev cumprir suas principais exigências: "desmilitarização", "desnazificação" e "status de neutralidade" da Ucrânia.

Anteriormente, o Kremlin também exigiu que a Ucrânia reconhecesse a Crimeia como parte da Rússia e as autoproclamadas "repúblicas populares" de Donetsk e Lugansk como independentes. Por sua vez, o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, mostrou-se disposto a desistir da adesão à Otan.

Embora poucas informações concretas sobre as conversações estejam sendo divulgadas oficialmente, um artigo do Financial Times da semana passada causou alvoroço: haveria um "progresso substancial" nas negociações, e um plano de 15 pontos estaria em discussão.

Segundo a publicação, Kiev estaria pronta para desistir de seu desejo de entrar para a Otan e de não estacionar sistemas de armas em bases militares estrangeiras no país. Como proteção contra a Rússia, a Ucrânia quer garantias de segurança dos EUA, Reino Unido e Turquia. Os representantes ucranianos dizem que Kiev precisa de garantias com efeitos juridicamente vinculativos.

Neutralidade em vez de adesão à Otan?

Alyona Hetmanchuk, chefe do observatório New Europe, em Kiev, chama a situação de "absurda". "Precisa-se primeiro chegar a um acordo sobre um cessar-fogo e, depois, realizar negociações concretas. Atualmente, quanto mais intensas são as negociações, mais bombardeios são realizados", afirmou.

Ela descreve a suposta disposição da Ucrânia de concordar com um status de neutralidade como a maior "concessão". "Não apenas porque a adesão à Otan é um objetivo constitucional, mas porque é apoiada por uma maioria sem precedentes", diz a especialista.

Mapa mostra avanço das tropas russas na Ucrânia

A oferta está vinculada a garantias de segurança que substituiriam efetivamente o artigo 5º da Carta da Otan sobre segurança coletiva e o objetivo de proporcionar defesa mútua por meios militares e políticos, se um dos membros da organização for ameaçado por um Estado externo.

Hetmanchuk afirmou, porém, que se trata de algo "bastante ilusório", porque não haveria vontade por parte dos países da Otan de fornecer tais garantias à Ucrânia. Também é pouco provável que a Rússia concorde com isso, afirma.

A especialista descreve o reconhecimento da Crimeia e da região de Donbass, que abriga Donetsk e Lugansk, como uma "linha vermelha" para Kiev. "Isso representaria uma capitulação completa", frisa.

Ela duvida que as negociações serão bem-sucedidas, mas acredita que devem "melhorar a situação humanitária e mostrar ao mundo que a Ucrânia está disposta a fazer certas concessões".

Moscou não fala mais sobre a destituição de Zelenski

Nas negociações com a Ucrânia, quando corredores humanitários foram discutidos pela primeira vez, "uma conversa sobre questões mais fundamentais parecia estar começando", disse Andrei Kortunov, diretor do Conselho Russo de Assuntos de Política Externa. 

"Houve declarações de que a 'desnazificação' exigiria um reinício do projeto do Estado ucraniano, talvez novas eleições e a remoção das forças nacionalistas de direita da arena política. Agora há uma agenda reduzida. Não se fala mais em destituir Zelenski", aponta Kortunov.

De acordo com o especialista, a principal exigência de Moscou diz respeito à desejada adesão de Kiev à Otan e à cooperação com a aliança militar. Quanto ao reconhecimento de Donetsk e Lugansk, essa questão poderia ser deixada de lado indefinidamente, e Kortunov considera possível uma retirada das tropas russas dos territórios conquistados desde o início da guerra.

Sem garantias de segurança

Robert Brinkley, ex-embaixador britânico na Ucrânia, não espera um avanço nas negociações entre Moscou e Kiev, o que, segundo ele, só poderia acontecer quando "ambos os lados estivessem prontos para isso". Mas, para ele, os dois países ainda estão tentando "melhorar suas posições".

Brinkley não respondeu diretamente ao ser questionado se o Reino Unido daria garantias de segurança à Ucrânia. Ele lembrou a experiência negativa da Ucrânia com o Memorando de Budapeste, de 1994, quando as potências nucleares Rússia, EUA e Reino Unido se comprometeram a respeitar a soberania e as fronteiras do país em troca da renúncia a armas nucleares herdadas da antiga União Soviética.

"Aquele documento não ofereceu nenhuma garantia [de segurança], por isso acho que a Ucrânia examinará com muito cuidado" os termos de um novo acordo, disse Brinkley, citando ainda a postura da Otan de não enviar tropas para a Ucrânia ou disponibilizar aviões para impor uma zona de exclusão aérea – um dos pedidos de Kiev.

Representantes da Rússia e da Ucrânia durante negociação em 28 de março
Representantes da Rússia e da Ucrânia durante negociação em 28 de marçoFoto: Sergei Kholodilin/BELTA/AFP

Putin quer ganhar tempo?

O ex-embaixador da Alemanha em Kiev Hans-Jürgen Heimsoeth espera um resultado das negociações apenas em algumas semanas. Para ele, ambos os lados estão conduzindo as conversações "por razões de relações públicas", mas há diferenças: enquanto a liderança russa se mostra intransigente, a Ucrânia está aberta para discutir a questão da neutralidade e das bases militares estrangeiras.

O jornalista Winfried Schneider-Deters, que viveu por muito tempo na Ucrânia, é o único entre os especialistas entrevistados que descreve as negociações como uma "cortina de fumaça".

"É uma manobra enganosa de Putin. Ele quer acalmar o Ocidente ao dar uma sensação de segurança e deixar a paz aparecer no horizonte, para que, assim, o Ocidente deixe de apoiar a Ucrânia com armas", considera o especialista.

"É também uma manobra para ganhar tempo. Depois que a primeira ofensiva falhou tão miseravelmente, ele precisa reunir forças para uma segunda onda de ataques."

O presidente Putin está buscando uma "solução militar", diz Schneider-Deters. Ao mesmo tempo, Kiev também precisa dessas negociações "para se recompor e treinar os voluntários que se apresentam para combater".

Citando o Memorando de Budapeste, ele afirmou que a Ucrânia não deveria aceitar garantias de segurança. Embora o Ocidente não lute na Ucrânia, ele poderia continuar fornecendo armas, diz. Para o analista, a guerra ainda vai durar muito tempo.