Rei Abdullah foi um reformador cauteloso
23 de janeiro de 2015Na ultraconservadora Arábia Saudita, mudanças são possíveis somente em ritmo lento. O rei Abdullah sabia disso ao tentar mexer cautelosamente nas estruturas sociais e políticas de seu país. Até a sua morte, em 23 de janeiro de 2015, o monarca de longa data não ousou executar reformas radicais.
Abdullah bin Abdulaziz al-Saud foi o sexto soberano desde a fundação da monarquia saudita. No entanto, ele ainda pertencia à segunda geração da Casa Real. Isso está relacionado com as regras de sucessão peculiares na Arábia Saudita: o trono não é herdado de pai para filho, mas entre os irmãos do fundador do reino, Abdulaziz al-Saud, morto em 1953 e que teve mais de 30 filhos. Quando Abdullah subiu ao trono, em 2005, ele tinha mais de 80 anos.
Abdullah cresceu na corte real, onde recebeu uma educação islâmica tradicional. Como muitos outros príncipes, ele foi incumbido de desempenhar funções públicas. Em 1962, assumiu o comando da Guarda Nacional. Mais tarde, se tornou o segundo e, finalmente, o primeiro vice-chefe de governo. Na monarquia saudita absolutista, o rei também é primeiro-ministro, e o príncipe herdeiro, vice-primeiro-ministro. Quando o seu meio-irmão e antecessor, o rei Fahd, ficou incapacitado devido a uma séria doença, Abdullah assumiu de fato o comando do governo em 1996.
Esforço por hegemonia regional
Na política externa, o rei Abdullah continuou o esforço pela hegemonia regional de seu país. Nesse ponto, ele tentou conter principalmente as pretensões de poder do concorrente Irã. Isso ficou claro também na guerra civil na Síria. Riad apoiou os rebeldes contra o presidente sírio, Bashar al-Assad, com vista a derrubar o regime pró-iraniano e, assim, enfraquecer Teerã.
Como rei saudita, Abdulah foi também o "Guardião das duas mesquitas sagradas". Com Meca e Medina, o país abriga os dois lugares mais importantes do Islã. Anualmente, milhões de muçulmanos de todo o mundo peregrinam até Meca. Assim, os soberanos sauditas exercem um papel de destaque no mundo muçulmano, levando o credo islâmico estampado na bandeira verde de seu país.
Os sauditas também têm uma posição especial por promover o wahabismo como uma interpretação muito rigorosa do Islã. Estado, indivíduos e fundações semioficiais não poupam esforços em exportar a intransigente vertente religiosa para outros países. Após os atentados de 11 de setembro de 2001, a Casa Real foi acusada de promover o islamismo radical em todo o mundo. Dentro do país, os wahabitas controlam a moral pública e o sistema judicial e de educação. Mesmo as menores reformas podem se deparar com a resistência feroz de religiosos ultraconservadores. Por esse motivo, Abdullah trocou diversos oponentes de suas reformas.
Primeira mulher em gabinete ministerial
Entre as críticas dos conservadores, estava a cautelosa valorização das mulheres. Depois de os homens sauditas receberem o direito de voto para eleições locais, a partir de 2015, o mesmo direito estava previsto para ser outorgado às mulheres. Além disso, em 2009, Abdullah convocou pela primeira vez uma mulher para o seu gabinete de governo. A vice-ministra da Educação foi responsável pelas mulheres no sistema de ensino separado entre os sexos.
Abdullah também abriu o órgão consultivo do país, o chamado Conselho Shura, para membros do sexo feminino, encontrando palavras fortes para os seus críticos: "Uma modernização equilibrada é um importante desafio, que corresponde aos nossos valores islâmicos. Em nossos tempos, não há lugar para fracos e indecisos." No entanto, as mudanças não foram tão longe. Em sua regência, as mulheres também não puderam dirigir automóveis. Assim, a Arábia Saudita continua a ser o único país do mundo a não permitir mulheres atrás do volante.
As suas reformas também não constituíram nenhum restrição dos poderes absolutos do monarca. O órgão consultivo quase não teve competências. Partidos políticos continuaram proibidos. Críticas à Casa Real e ao Islã eram tabus. As exigências por reformas mais amplas foram vistas como ameaça ao sistema de governo. Os críticos foram duramente punidos – como, por exemplo, o blogueiro Raif Badavi, que no ano passado foi condenado a dez anos de prisão e a mil chibatadas.
Os levantes da Primavera Árabe pouco foram sentidos na Arábia Saudita. Protestos contra abusos como o nepotismo e a corrupção foram reprimidos com forte violência policial. Tropas sauditas avançaram até mesmo sobre o vizinho Barein para proteger a monarquia local da ira dos manifestantes. Com isso, os sauditas tentaram impedir um alastramento da insatisfação para o seu próprio país. Afinal de contas, assim como seus antecessores, para Abdullah a manutenção da própria monarquia sempre veio em primeiro lugar.