Riga é Capital Europeia da Cultura em 2014
21 de dezembro de 2013Para a abertura, a população de Riga irá às ruas, numa ação que exige a participação de milhares de pessoas. Elas formarão uma corrente humana da antiga Biblioteca Nacional, nos arredores do centro histórico, até a imponente Nova Biblioteca, na outra margem do Rio Daugava, para, de mão em mão, transferir os livros de um prédio ao outro.
Uma mudança com participação popular, portanto, simbolizando o que importa para os responsáveis do evento Riga 2014: transformar e tomar iniciativa, para, em conjunto, colocar algo em movimento. "Em primeiríssimo lugar, este é um ano voltado para os moradores da cidade", aponta Aiva Rozenberga, diretora de programação do Ano da Capital da Cultura. Ela acredita que, se a população estiver entusiasmada e feliz, os outros também vão gostar.
Pouco dinheiro, grandes planos
Como Capital Cultural 2014 – título que divide com Umeå, na Suécia –, Riga precisa se virar com um orçamento modesto: apenas 24 milhões de euros, para cinco anos de preparativos, mais o evento propriamente dito. Por isso, ao contrário de outras cidades europeias, dispensaram-se os investimentos em infraestrutura. A nova Biblioteca Nacional, uma imponente montanha de vidro, já havia sido projetada nos anos 1990, quando Riga ia muito bem.
Até a crise financeira mundial, em 2008, a Letônia e sua capital vivenciaram um boom econômico. No entanto, poucos meses após a falência do banco americano de investimentos Lehman Brothers, um grande banco letão também quebrou. E foi assim que tudo começou: cortes salariais de até 30%, de milhares de postos de trabalho, das pensões, fechamento de escolas e hospitais. A economia do pequeno país, com apenas 2,3 milhões de habitantes, bateu no fundo do poço.
Desde então, muitos emigraram, enquanto outros lamentam – mais uma vez – o fim da era soviética, quando "uma coisa assim" não acontecia, quando todos tinham trabalho e o Estado cuidava de tudo. Mas quase não houve protestos, e cada um tenta dar um jeito dos próprios problemas. "O letão é, por natureza, um lobo solitário", comenta Anna Muhka, assessora internacional de imprensa da fundação Riga 2014.
No decorrer do próximo ano, porém, a ideia é, de forma lúdica e com os meios que fornece a cultura, mostrar aos cidadãos da capital que a coisa pode ser diferente.
Um povo musical
Na Letônia, a cultura sempre esteve ligada à música: os letões gostam de cantar. "Cantamos do berço ao túmulo", em qualquer época do ano e há muitas gerações, diz Muhka. "Afinal, nós éramos lavradores, primeiro para os soberanos alemães, depois para nós mesmos." E, como é sabido, o canto costuma ajudar no trabalho braçal.
E não somente nele. Na época da ocupação soviética, a identidade nacional era fortalecida nas festas populares em que se cantavam principalmente dainas, canções folclóricas letãs. Anna Muhka lembra que essas festas deram até origem à assim chamada "Revolução Cantante".
Em meados de 2014, 20 mil participantes de quase 90 países vão encher as praças e ruas da capital com seu canto, na competição coral World Choir Games. Além disso, durante todo o ano uma série de concertos trará estrelas da música mundial naturais de Riga, como o regente Mariss Jansons, a meio-soprano Elina Garanča ou o violinista Gidon Kremer.
E já no fim de semana de abertura em janeiro, a Ópera Nacional da Letônia estreia uma montagem multimídia de Rienzi, de Richard Wagner. O gênio musical alemão iniciou a composição da ópera durante seu período como mestre de capela em Riga, entre 1837 e 1839.
Olhar para o passado e o futuro
No total, a programação de Riga 2014 abrange cerca de 200 eventos e projetos culturais. Muitos deles enfocam a história europeia e a da Letônia. "Rota do Âmbar" não apenas dá uma visão do significado cultural da primeira moeda da região do Mar Báltico, mas também se indaga sobre os atuais negócios ao longo da rota de comércio que levava a Roma e ao Mar Negro. E questiona o que reserva o futuro, já que no início do ano o país adota o euro.
Em janeiro de 2014, o Museu Nacional de Arte da Letônia inaugura a exposição 1914. Segundo a diretora de programação Aiva Rozenberga, a organização achou importante incluir o início da Primeira Guerra Mundial na programação do evento, mas com uma abordagem inusitada.
O foco da exposição recai sobre artistas provenientes dos 11 países europeus fundados após a Primeira Guerra, pois não é novidade que a história desses países no século 20 foi marcada por crises. E a capital cultural Riga abre uma porta para o capítulo mais lamentável da história nacional: o edifício do antigo Comitê de Segurança do Estado (KGB), outrora um lugar de terror e intimidação, estará aberto ao público a partir de maio.
Moldando o futuro
Quando a diretora de programação Aiva Rozenberga conta sobre Riga 2014, ela prefere falar sobre projetos pequenos, capazes de colocar muita coisa em movimento de forma descentralizada e com poucas verbas. "Às vezes são projetos tão pequenos, que vocês, do Ocidente, iriam até sorrir", admite a assessora de imprensa Anna Muhka. Mas para Riga eles são importantes.
Ela conta de um pátio em meio a prédios residenciais simples, transformado em área verde pelos moradores com a ajuda de profissionais. Ali, agora as crianças têm um parquinho, e os adultos, um ponto de encontro. Um lugar onde a sociedade cresce com interesse no outro e onde os moradores se surpreendem com o quanto um dia de trabalho comunitário pode mudar. "Cultura começa lá dentro, no coração da pessoa", resume Rozenberga.