Rússia estuda formas de retaliar UE
6 de agosto de 2014Há um mês, o ministro da Economia da Rússia, Alexey Ulyukayev, estava confiante. A economia do país ainda não estava contra a parede por causa das sanções aplicadas pelo Ocidente. Ele admitia o risco de recessão e queda na arrecadação fiscal, mas, de maneira geral, Moscou não precisava temer as consequências de retaliações da União Europeia até aquele momento.
Agora, Ulyukayev deve estar vendo a situação de outra forma. No domingo (03/08), a companhia aérea Dobrolet, braço da estatal russa Aeroflot, suspendeu a venda de bilhetes. A empresa justificou estar sob uma "pressão sem precedentes", depois que parceiros europeus cancelaram contratos nas áreas de manutenção e seguro.
O diário Kommersant, de Moscou, comentou que a segurança demonstrada pelo Kremlin de que poderia lidar tranquilamente com as sanções não passou de um discurso político. "Pela primeira vez a UE conseguiu demonstrar os efeitos de suas sanções", afirmou o jornal.
Pressão na aviação
Em resposta, Moscou estaria estudando fechar o espaço aéreo russo para companhias aéreas ocidentais, segundo o jornal Wedomosti. A medida poderia custar até 1 bilhão de euros para as empresas europeias, que ficariam em desvantagem na concorrência com as asiáticas.
A aviação russa, porém, também sofreria as consequencias dessa medida. Por conta da suspensão dos voos da Dobrolet, as ações da Aeroflot já despencaram 7,8% desde o início desta semana. E, caso as companhias aéreas do oeste da Europa não possam mais sobrevoar o espaço aéreo da Sibéria, a Aeroflot deixaria de faturar alto: as taxas de sobrevoos são uma importante fonte de renda para a estatal.
Outro meio de pressão política que poderia ser usado por Moscou são suas matérias-primas. Cerca de um terço de todo o petróleo e gás importados por países da UE vem da Rússia. Segundo a especialista em energia Claudia Kemfert, porém, a equação não é tão simples.
"Não é bem assim. A questão é se os russos poderiam simplesmente aumentar preços. Há contratos em vigor", lembra Kemfert, do Instituto Alemão para Pesquisas em Economia. "Esses contratos, com validade de vários anos, estabelecem também preços para o gás natural."
A possibilidade pode ainda se transformar para a Rússia em uma faca de dois gumes: se por um lado o Kremlin poderia acertar em cheio a economia europeia, por outro, a Rússia poderia estar também se prejudicando. Grande parte da receita do país vem exatamente do negócio envolvendo suas matérias-primas. Caso o comércio de petróleo e gás com os países ocidentais sofra um grande impacto, a economia russa seria seriamente afetada.
Vigilância sanitária
Mas pelo menos em uma área os russos já demonstraram estar dispostos a travar uma disputa. No momento, está proibida a entrada em território russo de frutas e verduras produzidas na Polônia. Apesar de ser um golpe na economia polonesa, a medida não traz grandes consequências no abastecimento de alimentos na Rússia – mas confirma a disposição do Kremlin de revidar as sanções.
Não se tratou, porém, de um boicote clássico. Para suspender as importações, Moscou se baseou em um relatório de agentes da vigilância sanitária, que inspecionaram os alimentos com extrema exigência até encontrarem um pretexto para proibir sua compra por "motivos de higiene". A mesma manobra já foi feita, no passado, para importações de países bálticos e da Geórgia.
Nos tempos a Guerra Fria, os russos temiam os parceiros comerciais ocidentais. Os comerciantes americanos – duros concorrentes – agiam como jogadores de xadrez, calculando meticulosamente cada ação para poderem avançar nas próximas jogadas. Agora é o ex-agente do serviço secreto russo Vladimir Putin que precisa provar que é bom jogador.
No momento, porém, o Kremlin parece apenas pensar nos próximos instantes da queda de braço. Em resposta à insistência de Washington para que os europeus estabeleçam sanções ainda mais drásticas contra Moscou, fiscais russos de vigilância sanitária voltaram a agir. Desta vez, eles parecem ter descoberto "substâncias perigosas" no uísque fabricado nos Estados Unidos. Pelo que tudo indica, a economia americana terá que se preparar para uma eventual suspensão das exportações do bourbon para a Rússia.