Bissau: Aristides Gomes disposto a responder aos tribunais
11 de junho de 2020Na impossibilidade de conceder entrevistas, Aristides Gomes delegou o seu conselheiro para a comunicação social e assessor de imprensa, Muniro Conté, para falar em seu nome com a DW África.
Quatro meses depois do seu afastamento do cargo do primeiro-ministro da Guiné-Bissau, sob proteção da comunidade internacional, o ex-primeiro-ministro guineense manifesta-se disponível a responder perante a justiça sobre as acusações de que é alvo - se forem criadas as condições "num contexto de normalidade" e geridas pelas "instâncias competentes".
Aristides Gomes refugiou-se numa representação internacional em Bissau desde março, confirma o seu conselheiro.
Na altura, foi-lhe retirado o corpo de segurança e denunciara também que a sua residência privada foi "cercada por militares fortemente armados”.
Desde então, não se tinha notícias do político guineense acusado de má gestão do Estado.
O Governo liderado por Aristides Gomes, saído das eleições legislativas de março de 2019, foi demitido por Umaro Sissoco Embaló em finais de fevereiro deste ano. O Presidente guineense nomeou, então, o Governo da iniciativa presidencial, liderado por Nuno Gomes Nabiam.
O jornalista guineense Murilo Conté disse à DW África que, pela sua segurança, Gomes teve de pedir proteção internacional e está impedido de exercer a sua atividade política na Guiné-Bissau, sob pena de colocar a sua vida em risco.
DW África: Onde está o ex-primeiro-ministro da Guiné-Bissau, Aristides Gomes?
Muniro Conté (MC): Ele está num lugar seguro, protegido, porque as pessoas sabem as circunstâncias em que ele saiu da sua residência. Depois dos acontecimentos de 29 de fevereiro, houve uma tentativa de vandalização da sua residência. Então, ele teve de sair para um lugar seguro e muito bem protegido - até quando estivermos em condições de normalidade para que ele efectivamente possa regressar à sua casa e retomar a sua vida normal.
DW África: Há uma perseguição política? A sua vida estaria em risco? Ele foi proibido de exercer a sua atividade política?
MC: Na Guiné-Bissau, quando um primeiro-ministro deixa as funções, o que acontece é que este primeiro-ministro, normalmente, tem uma proteção até o ato de passar [o cargo]. Não há esta tentativa de coação, porque esta pessoa eventualmente não terá reconhecido um ou outro governo.
No caso do Aristides Gomes, o que aconteceu é que as coisas precipitaram nos dias que se seguiram à formação do Governo. Primeiro, houve a evasão da sua residência, na qual tiraram, à força, as viaturas que asseguravam a sua escolta enquanto titular dum órgão de soberania. E, ato contínuo, houve ameaças e, praticamente horas antes de sair da sua residência, houve uma espécie de ocupação. Nisso, ele tinha de sair da residência para proteger a si mesmo e posso assegurar que, neste momento, ele está num sítio protegido.
DW África: Aristides Gomes está sob a proteção da comunidade internacional?
MC: Exato. Porque respeita aquilo que são, digamos assim, as regras de protecção desta natureza, não pode, portanto, fazer nenhuma comunicação oficial.
DW África: Aristides Gomes foi convocado pelo Ministério Público, nestes últimos dias?
MC: Pelo que sei, não está na sua residência. Não sei se ele terá recebido [uma convocação] através de alguém. O que posso dizer é que ele está disposto a responder aos tribunais, mas num contexto de normalidade. Não deve ser um contexto de perseguição ou de coação, em que se está a desenhar uma espécie de justiça seletiva.
Sabemos que há processos muito mais urgentes. As pessoas estão a preocupar-se com um assunto que até todo mundo sabe como é que a questão dos títulos do Tesouro está a ser tratada. O Governo atual tem pago os salários e assegurado algumas despesas [decorrentes da pandemia] da Covid-19 atráves dos títulos do Tesouro.
O José Mário Vaz tinha "denunciado" em tempos. Mas hoje está a servir de oportunidade para o Governo acomodar algumas preocupações, não só no que se refere ao pagamento dos salários, mas também à realização de algumas esteiras.
Como estava a dizer, não é uma questão de a pessoa estar a responder ou não. Mas tem que se criar condições e tem que se dignificar. Um titular dum órgão de soberania, há atos prévios que se fazem antes dele ser conduzido para o Ministério Público para ser ouvido, através da Comissão Parlamentar de Inquérito.
Não vejo a necessidade de Aristides Gomes ser ouvido logo pelo ministério Público, quando há instâncias competentes que podem ainda dirimir esta questão, antes dele ser ouvido no Ministério Público.
DW África: É uma tentativa de deter ilegalmente e humilhar Aristides Gomes?
MC: Se estamos na Guiné-Bissau, num país em que acontecem as coisas que estão a acontecer - [nomeadamente,] perseguições, deputados que são espancados, ativistas que estão perseguidos – imagine o que seria do Aristides Gomes se não estivesse coberto duma protecção internacional.