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Como a guerra na Ucrânia mudou o mundo em 100 dias

Sonya Angelica Diehn
3 de junho de 2022

A Rússia invadiu a Ucrânia há 100 dias. A primeira invasão territorial de um Estado soberano europeu em 80 anos deixou um rasto de destruição e provocou uma crise alimentar e de refugiados.

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Foto: Olga Maltseva/AFP

Quando a Rússia invadiu a Ucrânia a 24 de fevereiro de 2022, começava o primeiro conflito militar em grande escala na Europa desde a Segunda Guerra Mundial, o que era inimaginável para muitos. A guerra também está a ter impactos inesperados, que estão a ser sentidos um pouco por todo o mundo.

A guerra mudou o mundo de diferentes formas. Resumimos aqui cinco:

Vaga de refugiados

Desde a invasão russa, cerca de 6,8 milhões de ucranianos fugiram do seu país. Além deles, há mais de 7,7 milhões de deslocados internos.

Depois de se refugiarem inicialmente em países vizinhos, pelo menos 3 milhões de pessoas prosseguiram a sua viagem para outras partes do mundo, de acordo com a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). Para além da Polónia, a Alemanha e a República Checa recebem atualmente o maior número de refugiados ucranianos, com cerca de 727.000 e 348.000, respetivamente.

Vaga de refugiados ucranianos

Cerca de 2 milhões de ucranianos regressaram ao seu país desde que fugiram pela primeira vez da guerra, embora alguns destes possam ter feito um vai e vem, observa o ACNUR.

Os ucranianos que chegaram à União Europeia receberam apoio, embora tenham tido de passar por sistemas de admissão complicados. Os refugiados que se instalam num novo país dependem tradicionalmente da rede de segurança social desse país, pelo menos durante algum tempo.

Crise alimentar

A Ucrânia é um importante celeiro e produzia (antes da guerra) cerca de metade do óleo de girassol do mundo.

Segundo o Departamento de Agricultura dos EUA, a Ucrânia era responsável por 15% do comércio mundial de milho e 10% do comércio mundial de trigo. O conflito cortou essas exportações, com a Rússia a continuar a bloquear os cereais nos portos da Ucrânia no Mar Negro.

Este estrangulamento fez-se sentir especialmente em países dependentes das importações de grãos e óleo de cozinha ucranianos, tais como o Egito e a Índia, respetivamente. No entanto, os efeitos cascata são mais vastos.

Alguns especialistas advertem que o conflito - em conjunto com condições meteorológicas extremas devido às alterações climáticas e ao choque económico induzido pela pandemia da Covid-19 - está a impulsionar uma crise alimentar global.

Em maio, o Conselho de Segurança da ONU advertiu que os níveis de fome em todo o mundo atingiram "um novo máximo", acrescentando que dezenas de milhões de pessoas poderão passar fome a longo prazo devido à guerra.

Protesto contra a invasão russa da Ucrânia na cidade alemã de Bremen
A União Europeia insurgiu-se contra a guerra na UcrâniaFoto: Mohssen Assanimoghaddam/dpa/picture-alliance

Entretanto, cerca de 23 países impuseram restrições à exportação de alimentos - uma indicação de que a segurança alimentar está a diminuir.

Segurança energética

A Rússia é o maior exportador de gás natural do mundo, o segundo maior fornecedor de petróleo bruto, e o terceiro maior exportador de carvão. Até à guerra, três quartos do seu gás e quase metade do seu petróleo bruto eram exportados para a Europa. Em 2020, o petróleo, o gás e o carvão russos foram responsáveis por um quarto do consumo de energia da União Europeia (UE).

Mas depois da Rússia ter invadido a Ucrânia, a UE procurou acabar com a sua dependência da energia russa. "Não podemos simplesmente confiar num fornecedor que nos ameace explicitamente", disse a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, em março.

No mesmo mês, a Comissão manifestou a intenção de fechar por completo a torneira aos combustíveis fósseis russos até 2030 e anunciou planos para reduzir drasticamente (em dois terços) a utilização de gás russo na UE, até ao final deste ano.

A maximização do armazenamento de gás é um dos pontos desse plano. A importação de gás natural líquido, por exemplo, dos EUA, é apontada como outra opção. No entanto, alguns peritos preveem uma escassez de gás e o seu potencial racionamento.

Muitos vêem o conflito como uma oportunidade para a UE não só se libertar da dependência da energia russa, mas também cumprir os seus compromissos em relação à proteção do clima através do fomento das energias renováveis e da eficiência energética. Ainda assim, há limites para a rapidez com que isto pode ser feito.

E o aumento da procura de fontes de energia não russas fez com que os preços disparassem em vários setores.

Devido à ofensiva da Rússia na Ucrânia, a UE está a tentar reduzir a sua dependência do gás russo
Rússia prevê que Europa sofra escassez de petróleo devido a embargoFoto: Patrick Pleul/dpa-Zentralbild/dpa/picture alliance

Aumentos de preços e inflação

A escassez tanto de alimentos como de energia tem contribuído para enormes mudanças na vida de muitas pessoas desde que a guerra na Ucrânia começou: Os preços subiram.

Sempre que falta um produto no mercado, o seu valor aumenta - e quando a comida e o combustível estão mais caros, o mesmo acontece com tudo o resto.

Os preços dos alimentos, em particular, estão a subir. O índice de preços dos alimentos da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), que mede a variação mensal dos preços de um cabaz de produtos alimentares, atingiu um máximo histórico em março deste ano.

A inflação afeta todos os aspetos da economia. A nível global, mais do que duplicou desde março de 2021, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho. Na zona euro, atingiu 8,1% no mês passado - um valor recorde.

Prevê-se que a inflação atinja ainda mais duramente os países de rendimentos mais baixos. Embora uma perspetiva recente do FMI preveja uma inflação de 5,7% para os países industrializados, esse valor é de 8,7% para os países em desenvolvimento.

Os especialistas preveem que os preços poderão permanecer elevados nos próximos anos.

NATO fornece apoio militar à Ucrânia
A NATO uniu-se e está mais forte desde a invasão russa da Ucrânia, afirmam vários observadoresFoto: Sean Gallup/Getty Images

O "renascimento" da NATO

A invasão russa da Ucrânia deixou também a sua marca na geopolítica. Alguns especialistas esperam uma nova divisão em blocos geopolíticos e económicos do Leste e do Oeste, com a Rússia e a China, de um lado, e a UE e os EUA a liderar o outro.

A Organização do Tratado da América do Norte, também conhecida como NATO, foi fundada após a Segunda Guerra Mundial, em 1949, e reúne os Estados Unidos da América, o Canadá e 10 países europeus. Nascida da Guerra Fria, tornou-se um "guarda-chuva" para a democracia e os mercados livres na Europa, com uma grande expansão para Leste em 2004.

Um ponto fundamental para a NATO é o Artigo 5º, que explicita um princípio de defesa conjunta. Ou seja, se qualquer membro for atacado, isto será considerado um ataque a todos, com retaliação militar a ser aplicada por cada membro.

Após um período de quase inação da NATO a ponto de, em 2019, o Presidente francês Emmanuel Macron, ter diagnosticado que estava em "morte cerebral", a guerra na Ucrânia está agora a colocar a aliança militar no centro das atenções.

Em grande parte, isso deve-se aos receios do projeto imperialista de Vladimir Putin para a Rússia. A Finlândia e a Suécia anunciaram recentemente a sua intenção de aderir à aliança, quebrando quase 70 anos de neutralidade.

O Presidente russo vê a NATO como uma ameaça ao seu país e tem alertado repetidamente para as consequências, caso a aliança permita a adesão da Ucrânia. Os críticos da organização afirmam que a sua expansão a leste constituiu uma provocação.

A NATO tem fornecido armas e equipamento à Ucrânia, embora tenha negado um pedido do Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, no sentido de impor uma zona de exclusão aérea sobre o país.

Por agora, a NATO continua a sua delicada dança de permanecer firme, mas dando passos cautelosos para não desencadear uma terceira guerra mundial.

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