Negócios na CPLP: Como ultrapassar obstáculos?
5 de dezembro de 2022A mobilidade entre os países de língua portuguesa ainda é "um problema complexo" e só será efetiva também quando houver meios de transporte "regulares e eficientes" necessários para fazer circular os produtos e as pessoas. O alerta é lançado, em entrevista à DW, por Marcos Rodrigues, que acaba de ser eleito em Lisboa novo presidente da Confederação Empresarial da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CECPLP), por um período de quatro anos.
O empresário cabo-verdiano substitui o moçambicano Salimo Abdula, com a promessa de melhorar o ambiente de negócios e fortalecer os empresários e as empresas da comunidade lusófona.
Marcos Rodrigues , avisa que ainda é uma miragem o projeto de livre circulação entre os Estados membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Para o novo presidente da Confederação, a mobilidade é o calcanhar de Aquiles da CPLP.
"É que um indivíduo para sair da Guiné-Bissau para Angola tem que passar por Portugal; de Cabo Verde para Angola tem que passar por Portugal e assim sucessivamente nos outros países. O que acontece é que a mobilidade só se faz se houver também transportes regulares e eficientes para podermos fazer essa ligação entre os países para podermos transportar os produtos e pessoas", exemplifica.
Geografia de desenvolvimento
Em declaração, Marcos Rodrigues diz que não se pode estar a falar de mobilidade sem transportes aéreos e marítimos, pois são efetivamente, a solução de fundo das questões matriciais do desenvolvimento.
"A questão do transporte aéreo é uma das questões que eu terei na minha agenda para falar com os presidentes dos países que compõem a CPLP, dentro do quadro da Confederação Empresarial para criarmos soluções e podermos alavancar as nossas economias", conta.
Rodrigues toma o exemplo da Guiné-Bissau que tem um potencial enorme e não consegue escoar os seus produtos agrícolas e de pesca, ficando dependente de uma ligação aérea que, muitas vezes não é perfeita nem regular.
"Por isso, nós temos que repensar toda esta geografia de desenvolvimento e enquadrar isto num processo integrado de desenvolvimento".
O novo presidente da Confederação diz que é preciso ultrapassar os obstáculos, porque já são sobejamente conhecidas as prioridades de desenvolvimento.
"Há um potencial enormíssimo. Não é por mero acaso que a maior parte dos países desenvolvidos são hoje observadores dentro de própria CPLP. Todavia, nós temos problemas complexos; é que nós não estamos a explorar as nossas potencialidades para poder alavancar os nossos países. Já chega".
Financiamento e cooperação empresarial
É preciso, no entanto, resolver a questão do financiamento e incremento da cooperação empresarial, tal como está plasmado na agenda da presidência angolana da CPLP.
"O Presidente da República de Angola, João Lourenço, já falou sobre esta questão. Sem um instrumento económico e financeiro, a CPLP não dará um passo suficiente para a sua grandeza. Obviamente, poderá ser um Banco de Fomento, por exemplo. Eu vejo com bons olhos esta questão, mas tem que ser um instrumento que esteja ao serviço dos empresários da CPLP".
Marcos Rodrigues assume o cargo na CPLP numa conjuntura que considera complexa, com desafios e novas oportunidades, "porque o mundo está numa transformação interessante" na sequência do surto de Covid-19 e da guerra na Ucrânia.
Nesta entrevista à DW, o empresário cabo-verdiano propõe-se a congregar e motivar sinergias para tirar vantagem das oportunidades.
Produzir e transformar
O também presidente da Câmara de Comércio do Sotavento em Cabo Verde olha para o atual conflito na Europa do Leste como uma oportunidade na área energética e alimentar. Mas o "grande problema" do continente africano é o défice na área da industrialização e da transformação para produzir mais e melhor.
"Na questão da transformação dos nossos produtos, nós estamos altamente carenciados e temos aqui grandes desafios. Apelo a todos os empresários, quer seja da CPLP quer seja fora do mercado da CPLP, que vejam África como uma oportunidade, mas do ponto de vista de se instalar [no continente] para poder produzir e transformar. Nós não queremos África só e apenas a fornecer matéria-prima, mas queremos uma África que produz e exporta".
Esta aposta também visa tirar vantagens do Comércio Livre em África, nomeadamente para a valorização dos recursos naturais, técnicos e humanos, segundo as palavras do também presidente do Conselho Superior da Câmaras de Comércio e Turismo de Cabo Verde.
"São os recursos naturais, a sua transformação, é a questão da agricultura; com esta guerra na Ucrânia, vimos a fragilidade global do ponto de vista alimentar. E África pode ser um celeiro importante mundial para o fornecimento de produtos alimentares".
O solo e a água são dois fatores competitivos que ajudam a "dar o salto". Marcos Rodrigues acredita que, com inteligência e investimento em novas tecnologias, será possível, em menos de cinco anos, transformar África num potentado na área da produção agrícola, para que o continente deixe de ser simples consumidor. "Este é um objetivo que a Confederação Empresarial da CPLP tem que ter na sua agenda", assumiu.
"Que é fazer sentir aos empresários africanos (dos PALOP), que devem transformar a sua atividade e investir em novas tecnologias, em parceria com os governos que também têm a obrigação de proporcionar fundos disponíveis para que esses empresários façam essa mudança de paradigma e que alcancem realmente para que África deixe de ser simples consumidor para passar a ser produtor".
"Instabilidade política não cria desenvolvimento"
Em reação aos recentes acontecimentos em São Tomé e Príncipe e na Guiné-Bissau, o presidente da Confederação afirma que a instabilidade política não cria desenvolvimento.
"Se os empresários ajudarem os países a desenvolver, há menos problemas de crises e há menos problemas de instabilidade, porque os países que vivem mais instabilidade são os países com mais problemas de desenvolvimento. Quando há problemas de desenvolvimento, há problemas gritantes do ponto de vista da estabilidade social, que cria problemas de instabilidade da governação".
Mário Rodrigues diz que a Confederação pode, neste âmbito, "ajudar aqueles países instáveis", através de investimentos, enquadrados nas respetivas estratégias de crescimento económico.