Portugal: Ativista antirracismo condenado por difamação
20 de outubro de 2023Em causa está uma frase escrita pelo arguido na rede social X (antigo Twitter), chamando "assassino" ao militante nacionalista Mário Machado. O ativista Mamadou Ba acusou Mário Machado de estar envolvido na morte de Alcindo Monteiro, em junho de 1995, por membros de um grupo de "skinheads".
Machado estaria ligado ao grupo, mas não foi condenado.
O Juízo Local Criminal de Lisboa referiu, em sentença, que Mário Machado não assassinou Alcindo Monteiro e decidiu, por difamação, condenar Mamadou Ba, que assistia à sessão por videoconferência a partir do Canadá.
O ativista luso-guineense foi condenado a 240 dias de prisão convertidos em multa de 2.400 euros.
"Os tribunais funcionam"
José Manuel Castro, advogado de Mário Machado, considerou "expectável" e "histórica" a decisão do tribunal: "Demonstra que, realmente, o Estado de Direito ainda funciona, os tribunais funcionam e estão livres ou isentos de pressões ou influências políticas".
O advogado explicou não ter sido pedida uma indemnização porque Mário Machado quis "deixar bem claro que não queria ganhar dinheiro com esta situação".
A decisão do tribunal foi aplaudida por Mário Machado, que disse tratar-se de "uma vitória pessoal".
"Quero só a minha honra estabelecida, e foi estabelecida. Agradeço ao sistema judicial por ter funcionado desta vez. É uma grande vitória que dedico ao meu pai", declarou.
Machado afirmou aos jornalistas que não é racista. "Eu tenho amor aos portugueses. Tenho muito orgulho em ser branco, mas não quero que os negros morram, nem quero matá-los", precisou.
Pouco depois destas declarações, ativistas solidários com Mamadou Ba chamaram a Mário Machado de "assassino".
Aquando das alegações finais, em setembro passado, o Ministério Público pediu pena de multa "proporcional e adequada" para o dirigente da organização não-governamental SOS Racismo.
Defesa promete recorrer da decisão
Em reação à decisão do tribunal, a advogada de Mamadou Ba apresentou um manifesto em forma de protesto.
"Se nunca esteve em causa a indesmentível participação de Mário Machado na razia racista em que foi assassinado Alcindo Monteiro, com o posicionamento do Ministério Público e esta sentença que o corrobora, podemos dizer que o Estado, através da instituição judicial, escolheu acolher os algozes e abandonar as vítimas da violência racial", afirmou Isabel Duarte.
Apesar da decisão do tribunal anunciada esta sexta-feira, Mamadou Ba havia dito, no dia das alegações finais, que não retira uma palavra ao que afirmou e insistiu na acusação a Mário Machado.
"Mantenho o que disse. Aliás, não sou só eu que o digo. Está plasmado nos vários documentos dos acórdãos dos vários tribunais que julgaram o caso" do cabo-verdiano Alcindo Monteiro, explicou o ativista. "Uma coisa posso dizer: não há meia-verdade na dignidade humana. Ou há dignidade ou não há."
A advogada de Mamadou Ba prometeu continuar a lutar "por todos os meios até às últimas consequências". Avançou ainda que apresentará recurso junto de tribunais superiores.
"Espero que o meu recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa modifique a sentença. Se não o fizer, recorrerei ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos", anunciou.