Crianças-soldado e a ONU
12 de julho de 2011Desde que a Convenção da ONU sobre os Direitos das Criança entrou em vigor, em 1990, estas se encontram sob a proteção especial da comunidade internacional. Entretanto, embora a situação tenha melhorado nestas duas décadas, as Nações Unidas estimam que, atualmente, 250 mil menores de idade sejam recrutados como soldados, em diversos países. Fato que, de acordo com os padrões internacionais vigentes, constitui crime de guerra.
Nesta terça-feira (12/07) a Alemanha introduz um debate aberto no Conselho de Segurança da ONU sobre formas de melhor proteger as crianças nas zonas de conflito. Na qualidade de membro não permanente, o país preside o órgão neste mês.
Durante os preparativos para o debate, em Nova York, a diretora-geral da Unesco, Irina Bokova, observou que décadas de guerra deixaram suas marcas no Sudão. O país acaba de se dividir. Na quarta-feira, o Sudão do Sul deverá ser acolhido na comunidade internacional como 193º membro da ONU.
Lá se percebe vivamente o que a guerra acarreta para os menores. "Escola e escolares foram sistematicamente atacados durante o conflito. Atualmente o Sudão do Sul tem a menor taxa de escolarização do mundo. Para as adolescentes, é maior a probabilidade de morrer durante o parto do que concluir a escola. Apenas 8% das mulheres sabem ler e escrever", relatou Bokova.
Lista vergonhosa
A Unesco calcula que, entre 1998 e 2008, 2 milhões de menores foram mortos em conflitos armados, 6 milhões ficaram gravemente feridos. Cerca de 250 mil são explorados como soldados, e a violência sexual é praticada sistematicamente.
De acordo com o direito internacional, usar crianças como soldados constitui um crime de guerra, da mesma forma que matá-las ou violentá-las. O Conselho de Segurança pode incluir numa lista negra um agente de conflito que cometa esse delito, quer se trate de um governo, quer de um grupo de rebeldes. Divulgada anualmente, a lista atual inclui, por exemplo, os radicais talibãs e a polícia do Afeganistão, assim como o Sudão, o Iraque e a Somália.
O que parece uma punição inofensiva representa um estigma de que a maioria procura se livrar, explica Peter Wittig, embaixador alemão na ONU. Para sair da lista negra, um país precisa propor um plano de ação e pô-lo em prática. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, explica que há 15 planos em nove regiões de conflito aguardando para ser aprovados, e mais outros dois são esperados até o fim do ano.
Wittig acaba de visitar o Afeganistão, chefiando uma delegação. Lá se constatou que o governo emprega esforços verdadeiros para melhorar a proteção infantil. Também o Chade, país do centro-norte da África que acabou de aprovar um plano de ação, pretende retirar todas as crianças de suas forças de segurança, para estar conforme com a Resolução 1612 das Nações Unidas, ressalta Ki-Moon, acrescentando: "Eu encorajo os governos da República Democrática do Congo, Mianmar, do Sudão e da Somália a seguir esse exemplo".
Fim das crianças-soldado
No início do debate desta terça-feira, foi votada no Conselho de Segurança uma resolução no sentido de condenar mais um crime, tornando-o motivo para inclusão na lista negra: os ataques a escolas e hospitais. A resolução proposta pela Alemanha foi aprovada por unanimidade. Com base nela, o Conselho pode aplicar sanções como medida punitiva.
Contudo, representantes de ONGs criticam o fato de essa possibilidade ser muito raramente colocada em prática. Entre esses críticos encontra-se Eva Smets, diretora da rede internacional de ONGs Watchlist on Children and Armed Conflict. "Até hoje, só se aplicaram em dois casos as medidas ampliadas: contra a Costa do Marfim, há alguns anos, e há pouco contra a República Democrática do Congo."
Nem todos os países e participantes do conflito armado temem ser incluídos na lista negra, aponta Smets. "O relatório do ano passado do secretário-geral da ONU continha uma relação dos transgressores contumazes. Dela constavam 16 grupos armados que são acusados há pelo menos seis anos. Era uma lista muito longa."
Ainda assim, os ativistas dos direitos infantis não perdem a esperança. Afinal de contas, se os progressos continuarem na atual medida, eles calculam que, dentro de 25 anos, pelo menos não haverá mais crianças-soldado.
Autor: Christina Bergmann / Augusto Valente
Revisão: Carlos Albuquerque