Bertelsmann e o balanço das nações
27 de julho de 2004Desde maio, o conglomerado alemão Bertelsmann possui seu próprio índice de avaliação política e econômica, o BTI – Bertelsmann Transformation-Index. Recentemente, o grupo divulgou o primeiro relatório avaliando a trajetória de 116 países emergentes ao redor do globo de 1998 a 2003. No caso brasileiro, o período engloba o último ano do primeiro governo Fernando Henrique Cardoso e todo o seu segundo mandato.
São duas categorias: a primeira, Status Index, avalia a situação atual do país no caminho para a democracia e a economia de mercado. A segunda, Management Index, avalia a existência de reformas políticas que assegurem a continuidade de tal transformação. O Brasil ocupa, respectivamente, as posições 22 e 14. Na América Latina, as melhores notas saíram para o Uruguai (13/6) e o Chile (8/3).
Boas notas para FHC
De acordo com a avaliação, o governo FHC respeitou as instituições democráticas, evitou o personalismo exagerado e deu início a importantes reformas. O presidente teria herdado problemas como o clientelismo e a corrupção, a fraca Justiça e a polícia muitas vezes violenta, um sistema partidário fragmentário e um sistema eleitoral pouco representativo, além de um federalismo urgindo reformas.
Do ponto de vista econômico, o estudo elogiou a liberalização do comércio exterior, a estabilização da situação macroeconômica e o controle da inflação, além da privatização de companhias estatais, mas chamou a atenção para déficits preocupantes na administração pública, na educação e na saúde. Apesar da redução das taxas absolutas de pobreza, o BTI 2003 alertou para a exclusão social, a má distribuição de renda e a disparidade regional.
Segundo o estudo, FHC teria obtido progressos sensíveis na reforma da administração pública e na educação, mas pouco sucesso na reforma dos sistemas fiscal e de aposentadoria. A vulnerabilidade da economia brasileira no sistema internacional continua grande e a dívida externa ainda limita consideravelmente a ação do Estado.
"Quanto à vontade política, ao aproveitamento de recursos e à cooperação internacional, o governo Cardoso merece boas notas", diz o estudo. Entretanto, "o governo obteve menos sucesso em relação ao planejamento e à implantação de reformas internas", salienta.
No topo da lista
As dez primeiras posições da lista de Management-Index ocupam Estônia, Lituânia, Chile, Botsuana, Máli, Eslováquia, Uruguai, Costa Rica, Coréia do Sul e Eslovênia. Alguns deles são pobres, mas são todos países que fizeram um extraordinário esforço político para estabelecer a democracia de mercado. Essa é a principal diferença do índice da Bertelsmann: ele considera também o esforço político, não apenas o econômico.
Entre os critérios do Management-Index estão utilização de recursos, poder de convencimento democrático e determinação para reformas. Já o Status-Index avalia a situação do Estado de Direito e a participação política dos cidadãos, mas também temas como a estabilidade da moeda e as condições para aquisição de propriedade privada.
"É um índice qualitativo, que nunca está livre de erros", explica Rolf Langhammer, do Instituto de Economia Mundial, de Kiel. Ele explica que especialistas em cada país recolhem os dados, que serão comprovados por outros especialistas. E, caso necessário, poderia haver ainda uma terceira comprovação.
Diferenças vêm à tona
Muitos países do topo da lista, por exemplo, são nações que ingressaram recentemente na União Européia e a posição que ocupam reflete o esforço para cumprir os critérios de admissão da UE.
Além disso, o estudo permite observar que, enquanto na América Latina as reformas são guiadas por um planejamento estratégico, na Ásia, por exemplo, a maioria dos países aposta na livre concorrência, muitas vezes sem levar em conta o critério democrático. O principal exemplo disso é a China. "Os países vizinhos sentem na nuca o vento quente da China e querem tentar aproveitar essa chance de crescimento e superar suas próprias crises", explica.
Para Langhammer, isso falta em outras regiões. "Isso não existe na América Latina, pois o Brasil não é um concorrente tão forte como a China."