Da Alemanha para o Waziristão: os lutadores alemães da Jihad
5 de julho de 2012Na lembrança do agricultor Friederich Bleckmann, os dois garotos permanecem tão diferentes como só irmãos podem ser. Bünyamin era "educado, aplicado e modesto", lembra. Já Emrah, o mais velho, era "agressivo e não sabia trabalhar sob pressão". O pai deles trabalhava na propriedade de Bleckmann, nas proximidades da cidade alemã de Velbert. Os filhos ajudavam nas férias escolares e nos finais de semana.
O agricultor diz que jamais poderia imaginar o caminho que os dois irmãos de Wuppertal escolheram: em 2010, ambos seguiram para a região montanhosa do Waziristão, perto da fronteira afegã, para se unir a militantes islâmicos. Bünyamin morreu pouco depois de sua chegada, durante um ataque de um avião não tripulado americano. A luta de Emrah durou até junho de 2012, quando foi detido.
A opção de jovens da Alemanha pela Jihad não é um fenômeno corriqueiro, mas acontece com certa frequência. As autoridades do país calculam que, desde o início dos anos 1990, cerca de 230 pessoas "ligadas à Alemanha e com um histórico de terrorismo islâmico" ao menos tentaram participar de um treinamento paramilitar. No caso de 100 delas, há indícios concretos de que isso tenha acontecido ou de que tenham participado de combates em regiões de conflito. Mais da metade teria retornado à Alemanha e cerca de 10 estão presos.
Os serviços secreto e de investigação levam a questão muito a sério. "Estas pessoas, uma vez de volta à Alemanha, podem desencadear atividades que põem em risco a segurança interna", diz uma porta-voz do Departamento Federal de Proteção da Constituição. Os membros do chamado Grupo de Sauerland, por exemplo, frequentaram um campo de treinamento no Paquistão, antes de terem sido detidos, em 2007, quando preparavam atentados a instituições norte-americanas na Alemanha.
"Outro fator de risco é que essas pessoas gozam de excelente reputação na cena islamita. Isso pode colaborar para uma radicalização crescente de militantes islâmicos, até então não necessariamente dispostos à violência", observa a porta-voz.
Caminhos para o terrorismo
Um exemplo são os irmãos Mounir e Yassin, de Bonn, que frequentemente colocam vídeos de propaganda jihadista na internet a partir do Waziristão. No vídeo mais recente, Yassin conclama à morte de jornalistas e de ativistas do partido radical de direita Pro NRW. Para muitas pessoas, os vídeos podem parecer mal-feitos e até mesmo ridículos. Mas a mensagem chega.
O militante Arid U., que em março de 2011 matou dois soldados americanos e feriu outros dois no aeroporto de Frankfurt, teria radicalizado suas ações em pouco tempo, apenas através da internet. No caminho para o aeroporto, ele teria ouvido uma canção de guerra de Mounir.
"A Al Qaeda e seus associados conseguiram criar um gênero próprio de filmes de propaganda", avalia o pesquisador Asiem El-Difraoui, que investigou o papel da propaganda online na formação dos radicais islâmicos. Segundo ele, os filmes romantizam a vida nos campos de treinamento, mostram todo o horror do sofrimento de civis muçulmanos e glorificam o martírio.
"Analisando os perfis de centenas de simpatizantes do jihadismo, pesquisadores noruegueses observaram que todos usaram muito a Internet e foram fortemente influenciados por esses filmes", afirma El-Difraoui.
O recrutamento de combatentes se dá de maneira diversa. "Temos jovens que se transformam da água para o vinho de repente, que descobrem os ícones da cena radical, simpatizando com o culto à masculinidade e à violência", descreve Claudia Dantschke, do Centro de Cultura Democrática de Berlim, que presta consultoria a famílias atingidas pelo problema.
Em outros casos o processo é longo. Em diversas cidades, há salafistas aplicando métodos usados normalmente por assistentes sociais para tirar os jovens da delinquência, com o objetivo de atraí-los para a sua vertente ultraconservadora da religião islâmica.
O alvo dessas ações são "jovens de origem muçulmana, mas não praticantes, com frequência dependentes de drogas, que cometem pequenos delitos e não têm formação profissional", explica Dantschke. A nova comunidade substitui a família, oferecendo reconhecimento e apoio. Na maioria dos casos, trata-se de convertê-los à religião e afastá-los da sociedade, mas não da prática violenta da Jihad. Apenas alguns dos recrutados, não raro aqueles que cresceram em ambientes sólidos de classe média, seguem a trilha da radicalização, observa Dantschke.
Os caminhos rumo ao islamismo militante também são diversos. Muitas vezes, o acaso desempenha um papel decisivo. "Alguns desses jovens pretendem ir para a Chechênia e acabam no Paquistão", diz o jornalista Wolf Schmidt, autor do livro Jovem, Alemão, Talibã e redator do jornal berlinense tageszeitung. "Eles não conhecem a área de combate, têm pouca noção do conflito e, muitas vezes, assustadoramente pouca informação sobre a religião que supostamente querem defender", diz o jornalista.
Os irmãos Mounir e Yassin, por exemplo, chegaram ao Paquistão através do Iêmen, unindo-se mais tarde ao Movimento Islâmico do Uzbequistão, do qual nunca haviam ouvido falar.
O destino predileto dos adeptos alemães da Jihad costuma ser o Waziristão paquistanês. Segundo os serviços de segurança, as autoridades alemãs observam, no momento, uma possível transferência desta tendência para a Somália. A região do Chifre da África tem ganhado importância como cenário da Jihad e destino de viagem de islâmicos radicais vindos da Alemanha.
Também o jovem Emrah deixou o Waziristão rumo à Somália no início de 2011, onde ele teria se unido às milícias Al Shabaab. No final de maio, depois de um ataque a um centro de compras no Quênia, ele caiu na mira de investigadores africanos. Acabou sendo preso na Tanzânia, em junho de 2012, e extraditado para a Alemanha. Hoje ele é acusado pela Procuradoria Geral da República de ter ligações com a Al Qaeda.
Prevenção no lugar de repressão
Com o propósito de evitar esse "turismo da guerra santa", a estada num campo de treinamento terrorista passou a ser considerada um delito na Alemanha desde 2009. No entanto, como salienta Schmidt, apenas reprimir não soluciona o problema. "É necessário agir a tempo e é preciso uma forma inteligente de prevenção", completa.
Algumas instituições se empenham em prol desta causa, entre elas o Centro de Cultura Democrática, em Berlim. Pais preocupados costumam procurar Claudia Dantschke e outros especialistas ainda no início do processo de radicalização. "É preciso então ver o que os grupos radicais oferecem aos jovens", diz Dantschke.
O que move esses jovens é, segundo ela, uma sensação de estranhamento e de não ser compreendido, de ser excluído, ou de busca por orientação e reconhecimento. Os conselhos fornecidos por Dantschke variam: em alguns casos, ela contacta autoridades muçulmanas; em outros, aconselha uma terapia familiar.
Também o caminho de Emrah poderia ter sido outro, diz o agricultor Bleckmann. "Ele era um jovem imaturo e não um terrorista islâmico", diz. "Era só um garoto violento, que precisava da ajuda de um assistente social engajado."
Autor: Dennis Stute (sv)
Revisão: Alexandre Schossler