Justiça deve atuar no caso das dívidas ocultas
9 de dezembro de 2016A sessão plenária decorreu à porta fechada, à semelhança do que aconteceu com as audições realizadas no âmbito deste caso. Um comunicado de imprensa do secretariado do Parlamento justifica que o regulamento daquele órgão legislativo estabelece que "terminado o inquérito, a Comissão reporta ao plenário os resultados para debate e deliberação à porta fechada”.
A Comissão Parlamentar de inquérito foi criada em agosto passado para investigar os contornos de dividas contraídas por três empresas com garantias do Estado, em 2013 e 2014, sem o conhecimento do Parlamento e dos parceiros internacionais
As dívidas, totalizando cerca de 1,3 mil milhões de euros, foram contraídas pelas empresas EMATUM, Proíndicus e Moçambique Asset Management. A DW África apurou que a comissão de inquérito mostrou-se convicta do mérito do contexto e fundamento para a contração dos empréstimos, e concessão das respetivas garantias pelo Estado.
Nas audições realizadas e documentos submetidos à Comissão constatou-se que as dívidas contraídas pelas três empresas tiveram como pressupostos a existência de ameaças à soberania e integridade territorial.
Tais ameaças, segundo foi referido, eram caraterizadas por atividades ilícitas de pirataria marítima, imigração ilegal, tráfico de drogas, pesca ilegal, presença de forças privadas de segurança marítima a proteger alvos privados nas águas territoriais nacionais, insuficiência de meios financeiros e humanos para eficaz proteção da soberania.
Conclusões
Contudo, a Comissão concluiu que o Governo violou a Constituição da República e as leis orçamentais, por ter superado os limites legais definidos sobre as garantias a conceder, sem autorização do Parlamento.
Para a Comissão, esta violação implica a responsabilidade dos órgãos e instituições envolvidos competindo a administração da justiça efetuar uma auditoria sobre a matéria, (no estrito respeito do princípio constitucional de separação de poderes dos órgãos do Estado.)
A Comissão de inquérito observa ainda que o Governo tinha o dever de comunicar ao Fundo Monetário Internacional (FMI) os empréstimos contraídos pelas empresas Proindicus e Moçambique Asset Management (MAM), tratando-se de dívidas de natureza pública.
Recomendações
A DW África apurou ainda que a Comissão recomenda que o Governo deve continuar a responsabilizar as empresas para o pagamento das suas dívidas, não deve cabendo quaisquer ónus ao erário público.
Recomenda, igualmente, o apuramento da efetiva aplicação dos empréstimos contraídos pelas três empresas, e a averiguação da existência ou não de indícios de aproveitamento ilegítimo e ilícito dos fundos públicos por pessoas privadas.
Com vista a acautelar situações futuras, a Comissão recomenda ao Parlamento o aprimoramento da atual legislação sobre a matéria. A Comissão de inquéritos realizou várias audições, incluindo vários governantes na altura da contração das dívidas nomeadamente o ex-Chefe de Estado, Armando Guebuza, o ex-Ministro das Finanças Manuel Chang, o ex-Ministro das Pescas Victor Borges, e o ex-Governador do Banco de Moçambique, Ernesto Gove.
Também foram ouvidos o atual primeiro ministro, Carlos Agostinho do Rosário, os ministros da Economia e Finanças, do Mar, Águas Interiores e Pescas, do Interior, da Defesa, e ainda o Presidente do Conselho de Administração das empresas EMATUM, Proindicus e Moçambique Asset Management, António Carlos do Rosário.
CIP exige divulgação dos resultados
Entretanto, Fátima Mimbire, do Centro de Integridade Pública (CIP), abordada pela DW África, defende que a apresentação dos resultados da Comissão Parlamentar de Inquérito devia ter sido pública, dada a importância do assunto:"Eu acho que é vergonhosa a forma como este processo está a ser concluído. Ou seja, os parlamentares vão apresentar entre eles o resultado de um trabalho cuja finalidade é esclarecer ao povo moçambicano o que aconteceu a volta destas dívidas e por via disso tomar uma posição."
Fátima Mimbire acrescenta que "há uma parte da dívida que foi soberanizada. Significa que eu como contribuinte tenho que pagar esta dívida. E significa que parte de grandes investimentos ou investimentos importantes para o país não vão acontecer por causa desta dívida. Entretanto, eu não posso saber em primeira mão como é que este processo aconteceu.”
Informações indicam que após a apresentação do relatório da Comissão de Inquérito ao Parlamento esta sexta-feira (09.12.) seguiu-se o seu debate, mas, ao contrário do inicialmente previsto, não chegou a ser tomada qualquer deliberação e desconhecem-se as razões.